Filha de sobreviventes do Holocausto diz que nazismo foi naturalizado
No 80Âș aniversĂĄrio da liberação de prisioneiros do campo de extermĂnio de Auschwitz, Clara Levin Ant, filha de judeus poloneses sobreviventes da Segunda Guerra Mundial, entende que o nazismo continua a existir com alguma força e cita o crescimento de nĂșcleos neonazistas pelo mundo e até no Brasil. Clara adverte que o nazismo, o neonazismo, o uso de sĂmbolos e gestos nazistas e o antissemitismo são crimes no Brasil e devem ser punidos. "O maior drama que nós estamos vivendo é que foi naturalizado."
"O antissemitismo, tal como o racismo, é crime no Brasil. É preciso deixar isso claro que para que volte a estar na pauta do dia a dia das pessoas o receio de que, quando se faz um gesto, participa de uma manifestação ou defende uma ideia nazista ou o antissemitismo, saiba que vai ser punido pela lei. Não dĂĄ pra ignorar, não dĂĄ pra fingir que a lei não existe", frisa a boliviana radicada no Brasil
Nesta segunda-feira (27), quando eventos em diversas partes do mundo lembram os 80 anos da libertação do campo de extermĂnio de Auschwitz, na Polônia, sob domĂnio do regime nazista pelas tropas soviéticas, durante a Segunda Guerra Mundial, os veĂculos da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) – AgĂȘncia Brasil, RĂĄdio Nacional e TV Brasil – conversaram com Clara Ant, que atualmente é assessora especial da PresidĂȘncia da RepĂșblica brasileira.
Clara percebe as manifestações neonazistas como tentativas de apagar na humanidade as ações contra o nazismo. "Estamos em um momento, em um mundo que parte da polĂtica, da humanidade, dos que lideram é destrutiva, predadora da cultura, do pensamento, da humanidade no seu significado mais pleno."
Sobre o gesto feito duas vezes pelo bilionĂĄrio sul-africano Elon Musk, de bater com força no peito com a mão direita e estender enfaticamente o braço, após a cerimônia de posse do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no Ășltimo dia 20, Clara Ant entende que foi uma saudação nazista inequĂvoca.
"A chave disso é a desinformação cultivada pela extrema-direita e seus lĂderes que trabalham para desinformar e para impedir que as pessoas tenham discernimento. De um lado, eles falam com quem vai gostar do gesto e, de outro lado, fingem um "não é comigo", para ninguém ficar informado de que aquilo tem a ver com a maior tragédia da humanidade, o nazismo."
Ela enfatiza que deve haver um esforço contra a desinformação a respeito do Holocausto. Clara aponta o resgate da verdadeira história do povo africano no Brasil graças à educação e a leis nacionais como o Estatuto da Igualdade Racial de 2010, e a lei das cotas raciais. "A desinformação que existia sobre a escravidão, hoje, tem uma barreira no conhecimento. Acho que a mesma coisa tem que ser amplificada no que diz respeito ao neonazismo e ao antissemitismo. Ambos são crimes na lei brasileira."
Clara explica que as atitudes neonazistas não podem ser acobertadas. "A gente não pode deixar passar pano nos recados como daquele perĂodo [a Segunda Guerra Mundial]. Todos os dias, temos que estar alertas pela democracia, porque a preservação dela é a melhor maneira de impedir que o racismo, o nazismo, o antissemitismo venham a vingar em algum paĂs."
A ativista ainda defende que seja feito um trabalho de conscientização para o combate à intolerância religiosa que persegue judeus no Brasil.
Os pais de Clara Ant se conheceram refugiados no Cazaquistão e se casaram em 1944. Em 1945, tiveram a primeira filha na Alemanha oriental. Os trĂȘs fugiram com outros sobreviventes do Holocausto para a BolĂvia, onde, em 1948, Clara Ant nasceu. E aos 10 anos veio morar no Brasil. A terceira filha jĂĄ nasceu no paĂs. As trĂȘs fazem parte da primeira geração do pós-Guerra.
E neste dia de preservação das memórias das vĂtimas do Holocausto, Clara Ant relembrou relatos de parentes sobre os horrores da Segunda Guerra, na Polônia. Somente o pai perdeu cerca de 41 familiares em uma mesma cidade da Polônia. Aos 14 anos, a mãe dela diz ter visto cidadãos serem fuzilados e enterrados em uma vala comum.
Histórias de mortes e desaparecimentos nas famĂlias paterna e materna que a própria classifica como sendo de um perĂodo de sombras.
Em oposição, Clara compartilha os exemplos de solidariedade que salvaram muitos judeus durante o conflito mundial e após o Holocausto. Ela também afirma ser testemunha da fase luminosa de criação da cultura antinazista nas pessoas. "O cinema, o teatro, a literatura, os debates condenavam este perĂodo do nazismo. Então, foi criada uma cultura universal contra o fascismo. Tudo era para impedir a volta do nazismo."
Em sua trajetória no Brasil, a arquiteta é uma das fundadoras do Partido dos Trabalhadores (PT) e da Central Ănica dos Trabalhadores (CUT). Na vida polĂtica, a ativista pelos direitos humanos e pela democracia foi deputada estadual constituinte, em São Paulo, e assessora desde o primeiro mandato do presidente Luiz InĂĄcio Lula da Silva, quando atuou na estruturação e implementação do programa Fome Zero.
Ela se recorda da reunião, em 2004, no PalĂĄcio do Planalto do presidente Lula com lideranças estrangeiras e brasileiras da comunidade judaica para pedir apoio para adoção do dia 27 de janeiro como data internacional em memória das vĂtimas do Holocausto. Segundo Clara, neste mesmo dia, Lula subscreveu a petição dirigida à ONU. A partir de 2006, foram registrados os primeiros eventos em celebração à data no Brasil.
Clara conta que, em 2010, o presidente Lula escolheu a primeira sinagoga das Américas, Kahal Zur Israel, em Recife, fundada no século XVII, para homenagear as pessoas assassinadas no holocausto.
Em 2008, houve o encontro do presidente brasileiro com o então presidente de Israel, Shimon Peres, na embaixada do Brasil em Pequim, China.
Os pais de Clara Ant se conheceram refugiados no Cazaquistão e se casaram em 1944. Em 1945, tiveram a primeira filha na Alemanha oriental. Os trĂȘs fugiram com outros sobreviventes do Holocausto para a BolĂvia, onde, em 1948, Clara Ant nasceu. E aos 10 anos veio morar no Brasil. A terceira filha jĂĄ nasceu no paĂs. As trĂȘs fazem parte da primeira geração do pós-Guerra.
E neste dia de preservação das memórias das vĂtimas do Holocausto, Clara Ant relembrou relatos de parentes sobre os horrores da Segunda Guerra, na Polônia. Somente o pai perdeu cerca de 41 familiares em uma mesma cidade da Polônia. Aos 14 anos, a mãe dela diz ter visto cidadãos serem fuzilados e enterrados em uma vala comum.
Histórias de mortes e desaparecimentos nas famĂlias paterna e materna que a própria classifica como sendo de um perĂodo de sombras.
Em oposição, Clara compartilha os exemplos de solidariedade que salvaram muitos judeus durante o conflito mundial e após o Holocausto. Ela também afirma ser testemunha da fase luminosa de criação da cultura antinazista nas pessoas. "O cinema, o teatro, a literatura, os debates condenavam este perĂodo do nazismo. Então, foi criada uma cultura universal contra o fascismo. Tudo era para impedir a volta do nazismo."
Em sua trajetória no Brasil, a arquiteta é uma das fundadoras do Partido dos Trabalhadores (PT) e da Central Ănica dos Trabalhadores (CUT). Na vida polĂtica, a ativista pelos direitos humanos e pela democracia foi deputada estadual constituinte, em São Paulo, e assessora desde o primeiro mandato do presidente Luiz InĂĄcio Lula da Silva, quando atuou na estruturação e implementação do programa Fome Zero.
Ela se recorda da reunião, em 2004, no PalĂĄcio do Planalto do presidente Lula com lideranças estrangeiras e brasileiras da comunidade judaica para pedir apoio para adoção do dia 27 de janeiro como data internacional em memória das vĂtimas do Holocausto. Segundo Clara, neste mesmo dia, Lula subscreveu a petição dirigida à ONU. A partir de 2006, foram registrados os primeiros eventos em celebração à data no Brasil.
Clara conta que, em 2010, o presidente Lula escolheu a primeira sinagoga das Américas, Kahal Zur Israel, em Recife, fundada no século XVII, para homenagear as pessoas assassinadas no holocausto.
Em 2008, houve o encontro do presidente brasileiro com o então presidente de Israel, Shimon Peres, na embaixada do Brasil em Pequim, China.
BrasĂlia (DF) 27/01/2025 - Foto de arquivo onde se vĂȘ uma reunião com presidente Lula - Hoje é o Dia Internacional em Memória das VĂtimas do Holocausto é comemorado em 27 de janeiro Foto: Ricardo Stuckert/PR - Ricardo Stuckert/PR
No momento da libertação do campo de extermĂnio de Auschwitz do domĂnio nazista pelo Exército Vermelho, durante a Segunda Guerra Mundial, cerca de 7 mil prisioneiros foram libertados, em janeiro de 1945.
Auschwitz é considerado o maior dos campos de extermĂnio da história e a queda dele é entendida como marco da derrota do nazismo. Estima-se que entre 1,1 milhão e 1,3 milhão de pessoas foram assassinadas ali, a maioria judeus.
O 27 de janeiro foi instituĂdo pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2005 como Dia Internacional em Memória das VĂtimas do Holocausto, o genocĂdio cometido pelos nazistas alemães e que matou sistematicamente, entre 1939 e 1945, 6 milhões de judeus, ciganos, homossexuais, comunistas, negros, pessoas com deficiĂȘncia, entre outros grupos considerados racialmente inferiores pelos adeptos do lĂder do Partido Nazista, Adolf Hitler.
Anualmente, a data reĂșne sobreviventes, autoridades e representantes da sociedade civil com o objetivo de manter viva a memória das vĂtimas; lembrar a tentativa de extermĂnio, sobretudo, do povo judeu; outros crimes cometidos no perĂodo; além de prevenir que estes eventos do século XX se repitam.
No Brasil, a Confederação Israelita do Brasil (Conib) postou em sua rede social sobre a importância de manter viva a memória deste capĂtulo da história da humanidade. "Lembrar não é apenas um ato de resistĂȘncia, é um compromisso com a vida." E acrescentou que o antissemitismo (preconceito e discriminação contra judeus) é racismo.
No Holocausto, a maioria dos assassinatos ocorreu em campos de concentração, projetados para trabalho escravo e extermĂnio em massa, por meio de fuzilamento e câmaras de gĂĄs. Majoritariamente no leste da Europa, os nazistas estabeleceram cerca de 15 mil campos e subcampos de concentração nos paĂses ocupados pela Alemanha Nazista.
Fonte: EBC